Numa época de muitos lançamentos, Ghost of Yōtei foi o mais recente título que tivemos acesso. O jogo é um exclusivo da consola PlayStation 5 e é a sequência de Ghost of Tsushima, lançado em 2020, embora não siga a trama do primeiro jogo.
INTRODUÇÃO
Ghost of Yōtei, foi disponibilizado no início do mês de outubro de 2025, em exclusivo para a PlayStation 5 e assinala o regresso triunfante dos estúdios de desenvolvimento Sucker Punch Productions ao género de ação e aventura histórica, depois do aclamado Ghost of Tsushima. O jogo herda a essência do seu antecessor, com destaque para o equilíbrio entre honra e a espiritualidade, mas com planos de vingança bem mais vincada, no entanto, paulatinamente vai demonstrando ambições mais profundas.
Mais uma vez, os criadores recorreram às fantásticas paisagens do Japão, mais concretamente na região de Hokkaidō em pleno ano de 1603. De uma forma bastante sucinta, os jogadores assumem o controlo de uma personagem de nome Atsu, uma ronin sedenta de vingança, que através das suas fantásticas habilidades de samurai, procura para fazer justiça a todo o custo.
Será que Ghost of Yōtei representa uma evolução significativa ou fica-se apenas por um refinamento sólido da fórmula introduzida pelo seu antecessor?
NARRATIVA
A trama desenrola-se em meados do século XVII, quando o Japão atravessava um período de relativa unificação sob o xogunato Tokugawa. Nesse contexto de estabilidade aparente, a região de Ezo, isolada e montanhosa, torna-se palco de uma nova forma de conflito, não entre exércitos opostos e de idealismos distintos, mas entre os samurais tradicionais e o das forças espirituais e ancestrais dos Ainu. A protagonista, Atsu, é uma ex-samurai renegada que busca vingança pela destruição da sua aldeia e pelo massacre efetuada à sua família, perpetrada por uma fação conhecida como “Os Seis de Yōtei”.
O enredo, à primeira vista, obedece ao arquétipo clássico da vingança pessoal, mas aos poucos vamos percebendo que a premissa, apesar de vincada no género de vingança, é apresentada de uma forma não tradicional, não se limitando apenas à fúria pessoal, abrindo espaço para alianças improváveis e para uma evolução de propósito que transcende a mera retaliação. Ghost of Yōtei expande o conceito, uma vez que contrariamente ao estereotipo habitual, Atsu não é uma heroína idealizada, mas sim uma mulher dilacerada entre dever e fé, entre humanidade e raiva.
O jogo aborda assuntos de identidade cultural, de colonização interna e do desaparecimento dos povos autóctones do Japão com uma sensibilidade raramente vista em títulos do género. A escrita é coesa e a direção narrativa aposta em longos silêncios, olhares e ambientes, utilizando o cenário como veículo emocional, algo muito visto no cinema japonês de Kurosawa e Mizoguchi.
O único aspeto menos positivo que pode ser apontado à narrativa, é que ainda que a história possua bons alicerces, o tema vingança já foi amplamente explorado em inúmeros jogos, pelo que o risco de soar a um pouco “mais do mesmo” é perfeitamente real.
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| ...perpetrada por uma fação conhecida como “Os Seis de Yōtei”. |
JOGABILIDADE
No campo da jogabilidade, tal com já referido um pouco acima, Ghost of Yōtei representa a consolidação daquilo o que Sucker Punch fez de melhor, apresentando agora uma maior verticalidade e robustez.
O combate, em tempo real e altamente técnico, oferece um sistema de posturas renovado, onde cada estilo tem impacto tangível no controlo da arma. Por exemplo, o uso da Kusarigama (foice e corrente) introduz novas possibilidades táticas, uma vez que permite alternar rapidamente entre um confronto de proximidade, mas é igualmente útil para combates a uma distância moderada. A inteligência artificial inimiga foi aperfeiçoada, obrigando o jogador a planear estrategicamente (ainda mais) os confrontos e especialmente a dominar o ritmo de ataque, antes de propriamente partir diretamente para uma luta desenfreada.
Relativamente ao restante, Ghost of Yōtei expande e aprimora várias mecânicas já experimentadas em Ghost of Tsushima, o combate mantém-se visceral, com destaque pleno no manuseamento em espadas, sabres, armas pesadas, táticas de esquiva e afins.
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| ...o uso da Kusarigama (foice e corrente) introduz novas possibilidades táticas... |
A forma como o estúdio de desenvolvimento fez a integração com o comando DualSense é exemplar e categórica. Cada golpe, cada bloqueio ou cada movimento específico ou até mesmo a andar de cavalo, todos são sentidos com detalhe e precisão. Uma palavra especial para as configurações dos gatilhos adaptativos, que conseguem perfeitamente reproduzir a tensão da lâmina. Outro destaque é a vibração háptica, que permite ao jogador diferenciar superfícies distintas, como por exemplo, caminhar sobre a neve é sentido de forma diferente do que quando caminhamos no cascalho. Há uma clara intenção dos programadores em fazer o jogador “sentir” tudo o que se passa no jogo, atrevendo-me mesmo a afirmar que é um dos títulos que melhor aproveita as capacidades fantásticas do DualSense.
O universo incrível de Ghost of Yōtei assente num fantástico mundo aberto é uma componente fulcral e essencial para o sucesso do título. Isso já se verificava em Ghost of Tsushima, porém, o mapa de Ghost of Yōtei evoluiu para outros patamares. A título exemplificativo, durante a minha jornada, tive a necessidade de escalar uma montanha repleta de neve, mais concretamente no Monte Yōtei. O que outrora podia ser encarado sem qualquer tipo de preocupação, desta vez, é necessário um pequeno planeamento da escalada, pensando em roupas especificas para as baixas temperaturas e até mesmo efetuar alguma gestão do próprio equipamento, o que, sem dúvida, acresce uma dimensão de sobrevivência, tornando o jogo mais envolvente e imersivo.
O vento espiritual continua a funcionar como o nosso guia, mas agora é acompanhado por uma espécie de fauna simbólica, que conduz o jogador para os objetivos principais, mas também a segredos ocultos.
O que menos me agradou, mas que costuma ser amiúde nos títulos com um mundo aberto de grandes dimensões, é o ritmo, que, na minha opinião, por vezes, abranda em demasia. É claramente uma consequência da estrutura de missões, que vai alternando entre momentos de contemplação poética e outras missões recheadas de combates explosivos ou simplesmente atividades secundárias repetitivas e certas missões de escolta ou coleta que, lá está, quebram o ritmo. Ainda assim, essa cadência irregular até acaba por reforçar o caráter meditativo do jogo, mas, sinceramente, origina que o jogador possa, eventualmente, perder algum interesse, desviando-se demasiado da narrativa principal.
Em síntese, a jogabilidade de Ghost of Yōtei representa uma maturação da fórmula de sucesso apresentada no seu antecessor, sem ser radicalmente nova, mas suficientemente refinada e polida para satisfazer todos os jogadores. O melhor elogio que pode ser feito, especialmente para os jogadores que deixaram o primeiro jogo de lado, é que vão encontrar um título mais refinado e requintado, como se a fórmula tivesse sido polida até atingir um estado mais completo e absoluto, tornando a experiência mais próxima da excelência.

...a jogabilidade de Ghost
of Yōtei representa uma maturação da fórmula de sucesso apresentada no
seu antecessor...
LONGEVIDADE
Ghost of Yōtei é um daqueles títulos que deve e merece ser jogado com tempo, de forma a apreciar algumas das mais belas paisagens desenvolvidas para um videojogo. Porém, algo como 50 horas deve ser suficiente para terminar a trama principal e todas as atividades secundárias, mas isto irá sempre depender da destreza e experiência do jogador, mas no seu geral, Ghost of Yōtei oferece uma longevidade respeitável.
O mundo do Japão feudal é bastante generoso, convida à exploração, com uma trama principal bem delíneada, múltiplas atividades secundárias, segredos, pequenos templos, pinturas rupestres e santuários submersos revelam fragmentos da história, incentivando a exploração. As missões secundárias, que são num número bastante considerável, não existem só porque sim e/ou para aumentar o conteúdo proporcionado ao jogador. A maior parte delas possui uma espécie de narrativa própria, mas, através das personagens encontradas ou das suas próprias vivências, estão interligadas com a trama principal.
Apesar de não existirem múltiplos finais, como ocorre noutros jogos, as escolhas e decisões que o jogador faz durante a demanda podem afetar o destino de alguns dos nossos aliados. É sem dúvida um aspeto interessante, que pode prender o jogador ao ecrã, sobretudo a jogar novamente o título, optando por outro tipo de escolhas, de modo a viver uma experiência distinta. Acredito que muitos dos fãs mais acérrimos irão, certamente, guiar a Atsu por outros caminhos.
Entretanto já foi confirmado pelos desenvolvedores que vai ser disponibilizado no futuro, mais concretamente algures em 2026, o modo Legends, um DLC multijogador cooperativo gratuito, para quem possui o jogo original, que acrescenta mais motivos para voltar a jogar o título e prolonga o interesse para além da campanha solo.

Ghost of Yōtei é um
daqueles títulos que deve e merece ser jogado com tempo, de forma a apreciar
algumas das mais belas paisagens desenvolvidas para um videojogo.
GRAFISMO E SONOPLASTIA
Escrever algumas palavras sobre o grafismo de Ghost of Yōtei é uma tarefa complicada, porque conseguir transmitir por frases aquilo que sentimos ao ver certas paisagens e determinados detalhes do jogo não é, propriamente, muito simples. Mas vou tentar!
Visualmente, Ghost of Yōtei é um colosso técnico e artístico. Desenvolvido nativamente para a PlayStation 5, o jogo faz uso total das capacidades da consola, resultando numa estética quase pintural. Os contrastes existentes, como por exemplo, entre a neve e o sangue, entre o brilho do pôr-do-sol sobre os campos de bambu e o nevoeiro matinal que se dissolve ao amanhecer, compõem um espetáculo visual digno de cinema. E não estou a exagerar! Mas posso continuar. A nitidez e profundidade são impressionantes, cada cenário descoberto parece saído de uma obra pintada à mão, revelando um trabalho excecional e com uma preocupação estética. Para quem gosta de personalização, a opção de filtros cinematográficos, incluindo o famoso modo “Kurosawa Mode”, reforça essa dimensão artística.
A modelagem facial das personagens e o realismo das animações corporais estão entre as melhores da geração atual, com expressões subtis que traduzem dor, dúvida ou serenidade. Mesmo em cutscenes silenciosas, os olhos de Atsu comunicam mais do que muitas palavras.
A banda sonora, composta por Shigeru Umebayashi (conhecido pelo trabalho em House of Flying Daggers), é um dos pilares do jogo e contribui assertivamente para o sucesso da experiência. As faixas alternam entre melodias melancólicas, espirituais e outras que combinam com a brutalidade dos combates. Cada local tem uma identidade sonora distinta, por exemplo, o vento nas planícies de Ezo soa diferente do sopro gélido nas cavernas do Yōtei.
Os efeitos especiais também se encontram num altíssimo nível, como o som do metal que corta o ar, flechas a assobiar, o crepitar da neve sob os pés, o eco distante de uma flauta Ainu, o estalar de galhos, tudo isso contribui para uma imersão quase sensorial. Se o conseguirem, porque eu optei pelo Português, devem jogar com as vozes em japonês que são interpretadas com autenticidade e conferem um tom mais emocional à experiência. O som ambiente e o silêncio intencional são igualmente poderosos! Em certos momentos, o som desaparece por completo, deixando apenas o vento ou o bater do coração da protagonista, reforçando a carga simbólica da narrativa.

Visualmente, Ghost of Yōtei
é um colosso técnico e artístico.
CONCLUSÃO
Ghost of Yōtei é uma obra artística de excelência. Não é apenas uma sequela espiritual, mas uma consolidação primorosa da visão da Sucker Punch. Mantém as raízes de Tsushima, mas ousa mergulhar mais fundo no território do mito e da espiritualidade japonesa, oferecendo uma jornada intensa, brutal e sentimental.
Tecnicamente é sublime, narrativamente é intenso e emocionalmente autêntico. Não revoluciona o género, mas eleva-o a um patamar de eleição. É uma experiência que exige tempo, atenção e sensibilidade, sendo um daqueles raros jogos em cada passo, cada golpe e cada silêncio têm peso e significado. Seguramente, uma das obras mais importantes do ano 2025.
Em suma, Ghost of Yōtei é um título obrigatório para todos! É uma proposta ambiciosa que reúne muitos elementos de excelência, uma narrativa com motivação clara e emocional, uma jogabilidade fluida e bem suportada pela tecnologia da PS5, visuais belíssimos e uma sonoplastia envolvente. É um título que recompensa tanto quem procura adrenalina como quem aprecia momentos mais contemplativos na exploração de mundo aberto.
Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas




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