No entanto, apraz-me referir que
nos jogos atuais, é cada vez mais frequente, a narrativa bem estruturada,
delineada e alguma até baseada em fatos verídicos, se sobrepor ao simples
conflito, onde uma personagem surge apenas com o objetivo de fazer justiça
pelas próprias mãos. O paradigma está a transmutar e o que outrora era
valorizado pelo jogador, como combater, conquistar e dominar está
paulatinamente a ser permutado pelo recuperar, coadjuvar e proteger.
My Memory of Us
desenvolvido pela Juggler Games, um estúdio localizado na cidade Polaca de
Varsóvia, enquadra-se claramente nesse contexto, onde o ponto forte é a
recordação de uma amizade entre um menino e uma menina, feita em tempos
difíceis, de terror, dor e exclusão num mundo onde as pessoas eram forçadas a
viver em dois lados artificialmente isolados e antagónicos. A conhecida
expressão “um amigo é sempre um amigo”,
nunca teve tanto significado como neste título, pois juntos somos sempre mais
fortes e a cruel realidade torna-se muito mais suportável.
Em My Memory of Us a
história é uma fábula da invasão por parte dos soldados alemães à Polónia, em
meados de 1939, circunstância que viria a precipitar a célebre Segunda Guerra
Mundial. Apesar de ser um conto imaginário, a sua composição literária está
repleta de detalhes históricos, situação que lhe confere de traços de
veracidade. O jogador assume o destino de duas crianças sem nome, uma menina e
um menino, que após serem violentamente afastados dos seus entes queridos,
vêem-se forçados a colaborar mutuamente para não serem capturados pelos
terríveis soldados robôs germânicos, liderados pelo o temível Evil
King.
Na aventura em “side-scrolling 2d”, ambas as infantis
personagens têm características próprias, por exemplo, a menina é capaz de
acelerar o passo, fugindo aos inimigos, o menino possui a habilidade de se
esconder em determinadas zonas do cenário, enganando os hostis. Cabe ao jogador
decidir quando usar cada personagem individualmente, sendo possível também
fundir ambas as habilidades, colocando as crianças de mão dada, permitindo
utilizar ou a corrida ou o esconder, em conjunto, de modo a concluir com
sucesso delimitadas zonas do jogo. Para além disso, no decorrer da trama, somos
postos à prova com diversos quebra-cabeças, que só os conseguiremos ultrapassar
se combinarmos todas as ações referidas de uma forma inteligente e perspicaz. É
importante referir que outras (poucas) capacidades são usadas no decorrer do
jogo, mas vou abstrair-me de indicar, para não estragar a experiência.
A sua trama é claramente um dos
aspetos mais bem conseguidos neste jogo, uma vez que já por si só, a Segunda
Guerra Mundial é um tema que desperta inúmeros sentimentos, mas os produtores
foram ainda mais longe, provocando emoções fortes ao fazerem-nos sentir
responsáveis por comandar o destino de duas inocentes e indefesas crianças,
perante todas as atrocidades que vão aparecendo no seu caminho.
Em termos gráficos, apesar de
obviamente não ser possível comparar com as grandes produções atualmente
existentes no mercado, My Memory of Us volta a surpreender,
ao apresentar uma direção de arte muito particular e peculiar, mas que resulta
absolutamente bem. Durante todo o jogo é usado um estilo baseado na sua grande
maioria em tons monocromáticos, com exíguas minudências em vermelho, sobretudo
nas vestes de algumas personagens, pequenos balões de diálogo ou detalhes
importantes no cenário que os produtores fizeram questão de salientar para
captar a atenção do jogador. Inicialmente pode parecer algo estranho e confuso,
mas acabamo-nos por habituar e deliciar com essa situação, fazendo-nos
seriamente refletir que por vezes o mais simples, desde que bem concebido, pode
também ser fascinante.
Se nas vertentes já referidas,
narrativa e grafismo, My Memory of Us foi uma agradável
surpresa, quer na jogabilidade e quer na longevidade, o mesmo já não se
verificou. Compreendo que a sua premissa seja vocacionada para os jogadores
mais novos, mas na generalidade, limitamo-nos a seguir as instruções presentes
nos balões de diálogo, para alcançar com sucesso o objetivo. Os quebra-cabeças
que nos vão sendo colocados durante o decorrer da ação, são demasiado
simplistas e mesmo até os mais distraídos, os conseguiram superar sem muita
dificuldade.
Ao nível da sonoplastia, a
história é narrada por um ator bem conhecido da sétima arte, Patrick
Stewart, que contracenou em filmes de sucesso, como por exemplo, Star
Trek, X-Men ou mais recentemente em Logan. O seu timbre de
voz é inconfundível e assenta que nem uma luva, ao relatar uma história que
emociona e que toca no coração de qualquer um.
Em suma, My Memory of Us
conquista-nos através de uma história marcante, criada principalmente para
passar uma mensagem sobre as bárbaras atrocidades cometidas naquela era, através
de um estilo visual bem singular, mas peca sobretudo na demasiado simplista
jogabilidade, o que pode aborrecer os mais exigentes.
NOTA: Esta análise foi
possível realizar graças ao envio do código do jogo por parte da Imgn.pro e
Juggler Games. A plataforma utilizada foi a PlayStation 4 verão normal.
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